Manifesto do coletivo Pó de Poesia

O Poder da Poesia contra qualquer tipo de opressão
Que a Expressão Emocional vença.
E que o dia a dia seja uma grande possibilidade poética...
Se nascemos do pó, se ao morrer voltaremos do pó
Então queremos Renascer do pó da poesia
Queremos a beleza e a juventude do pó da poesia.
A poesia é pólvora. Explode!
O pó mágico da poesia transcende o senso comum.
Leva-nos para um outro mundo de criatividade, imaginação.
Para o desconhecido; o inatingível mundo das transgressões do amor
E da insondável vida...
Nosso tempo é o pó da ampulheta. Fugaz.
Como a palavra que escapa para formar o verso
O despretensioso verso...
Queremos desengavetar e sacudir o pó que esconde o poema...
Queremos o Pó da Poesia em todas as linguagens da Arte e da Cultura.
O Pó que cura.
Queremos ressignificar a palavra Pó.
O pó da metáfora da poesia.
A poesia em todos os poros.
A poesia na veia.


Creia.


A poesia pode.


(Ivone Landim)



quarta-feira, 29 de junho de 2011

Aos teus pés

Meu São João encontrou-me de joelhos, despalavreando as rezas que aprendi da minha

mãe. O tempo arrastou-me pra lá e pra cá e derrubou – me de onde nunca saí: desta

casa, dos pés desse oratório, três filhos e um homem que já foi meu e hoje não é mais

de ninguém: Gabriel e Belzebu, sem lado de avesso nem desavesso, surra de cinturão

e doce de mamão. Nas quebradas da serra do Milho, o foguetão ribomba, fazendo eco

de grota adentro enquanto tento rezar um pai-nosso, catando palavras no meu juízo

desleriado, como que esvazia um mealheiro, moeda atrás de moeda, uma fé amolada

que não me dá mais sustância de fincar o pé, levantar a cabeça e pelejar contra

as desencontrancias da vida. A janela aberta traz o frio das serras e a visão da minha

fogueira, tão bela, isolada e desolada, tão grande, quase um pecado de boniteza num

tempo de coisa santa, do meu São Joãozinho, ali, no meio do meu terreiro varrido e

varrido desde manhã cedo. Olho a estampa de meu santo no oratório, abraçando seu

carneiro, mas o olhar se desimpacienta e percorre o resto da sala, os retratos retocados

do dia do meu casamento e o do meu pai e minha mãe – na graça de Deus desde 97.

Minha mãe queria ser enterrada de mortalha, mas no calor da doença, arrenegou tudo,

como quem quer apostar contra a morte e testar se a gente acreditava mesmo que ela já

se ultimava. Neguei que tinha costurado a mortalha, mas minha irmã Corina, feito os

pés da Besta, contou que já estava cozida e dobrada; tudo no medo torto de

desgostar nossa mãe, até na hora da morte – dizia olhando pro chão, dando um

riso doido, abilolado mesmo. Meus meninos foram cedo pra rua, catar namorada nas

festas, precisão de mulher é bicho danado. Fora as velas do oratório, a casa tá toda

apagada, um sossego frio me abraça pelas costas. Levanto, no meu quarto, acendo

a luz, visto a mortalha da velha, vejo o corpo estrebuchado de meu marido, olhar

grelado daquele que sangrei feito um bode, em cima da cama, sem raiva e sem medo,

só por precisão minha. Beijo-lhe a testa, boto a faca encima do seu peito, entre as

mãos: rosário de ateu desgraçado. Do espelho da porta do guarda roupa, uma

boniteza triste vestindo aquela roupa. Mas tudo ficou pra trás, o que vacilou eu

empurrei no buraco das desacontecencias. Resoluta, abro a porta da frente, sentindo

a friagem do sereno no rosto, caminho até o terreiro, mergulho no ardor de meu São

João; o fogo queima por dentro e por fora, mas a dor já não está mais aqui. Nem eu.


Conto de André Albuquerque

terça-feira, 28 de junho de 2011

Xeque-Mate 2.0

O mundo é um tabuleiro
A vida é um jogo

Em casa você é o Rei
No trabalho Peão
Na rua um Cavalo

Em casa para a sua mulher você é o Rei
Ou um Cavalo
Para seus filhos o Bispo
Ou uma Torre

No trabalho para o seu patrão
Peão
Para os subordinados você é o Rei
Ou um Cavalo

Na rua é o Rei
No trânsito Cavalo
Na multidão só mais um Peão
Em si a Torre

Para seus familiares a Torre
Às vezes é o Rei
Outras Peão
Às vezes o Bispo
Ou Cavalo

Para seus amigos a Torre
Também é Rei
Às vezes Peão
Outras o Bispo
Ou Cavalo

Sua mulher pede o divórcio
Você é um Cavalo o Bispo a Torre
Foi demitido
Você é o Bispo a Torre
Vai parar no xadrez
Você é a Torre

Você é ceifado pela Rainha Negra
E substituído por novas peças
Você é a Torre

No lar
Outro Rei outro Bispo outro Cavalo
No serviço
Outro Rei outro Peão outro Cavalo
Lá fora
Outro Peão outra Torre outro Cavalo

Cavalo Cavalo Cavalo

Todas as peças se deslocam lentamente
Mas sempre se encaixam perfeitamente

Poema de Andri Carvão

domingo, 26 de junho de 2011

PORTA



Poderei estar abrindo
Um céu de incertezas
Que nem mesmo sei
Se existem

Pode ser que sim

Noite fria, gelada é inverno no sul
Solidão ao som de So far away
Penso em dizer mas, I can’t say
nem mais um clique no menu

Penso em dormir mais cedo
Vejo sua fotografia
A ficção de mais um dia
Acho que estou delirando

Pode ser que sim, delirar
Com um rosto desenhado
Cabelos cacheados
Sobrancelhas, boca, olhar

Me olho longo tempo no espelho
minha barba grande e terrível
Me faz pensar que perdi o nível
Preciso sim de você, um conselho

Poema de Kleber J G Martins

sexta-feira, 24 de junho de 2011

"Põe água na luz"

A tarde já ia embora, na fazenda "Soledade"
Primeira noite que iria passar lá
Namorava a minha futura esposa.
Fomos no final do rego d´água verificar o dínamo

A correia estava bamba !
Meu cunhado entrou no fosso, viu a ponta da cetilha
Regulou a boca de saïda d'água
Trocou o carvãozinho...

Correia esticada, carvão trocado,
Fomos na represa soltar a água
A luz foi chegando aos poucos...
Clareou de vez !

Acendeu o rádio que chiava
Chiava mais do que falava
Era assim, toda noite na roça
Äs vezes, a gente, distrai'dos lá em baixo, ouvia a sogra gritar:

Põe água na luz!..

Cetilha: boca que regula a sa'ida d`água ...e toca rodas horizontais...

Poema de Victorvapf

Exegese

Não é somente da rosa-flor
Perfume-rosa, rosa augusta de
Perfilados dentes alvos
Que se colhem palavras para a
Composição do poema
(palavras densas de açúcar como o são
as passas estragadas; palavra-confeito
que se desfaz na boca, espraiando-se
pelas glândulas salivares)

Reter a paisagem, descobrir
O vocábulo entranhado no coração
Dos monturos, a palavra inservível
Presa de si mesma
Verbo em decomposição, destilando
Odores de metano

Esperar a noite, o cair da noite
O desenlaço de suas pétalas noturnas
E das sombras ver surgir
Seu tropel de criaturas segregadas

Vinde palavras prostitutas, ébrias,
Indigentes, viciadas de toda espécie
Escutai o bater de asas, um anjo
Por ti está em vigília
Ainda que um anjo coxo
Espécie de Quasímodo alado

Adentrai vossa casa, não temeis
Mesmo que edificada sobre o
Moralismo movediço de tratados
E convenções

Repousai na face virgem e alcalina
Do papel
Inaugurai nesta nova pátria inominada
Sob o estatuto do mencionado impossível
O tempo do caos transcendente


Poema de Glauber Ramos

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Último

(data-vaga)


deposta coincidência
aleatório devaneio ao arbítrio-livro de mim
razoável-preço
à pena que me vale em metade
à curva qual me re-forma do
fim

re-lapso
(ensejo)

ao acto consumado
em previsão e lenda
é
apenas à curta-metragem
da frase sem erros
sem
margens
(nem fé)

posto que.
término

rescisão e oferenda
base de consulta

oh! brevidade rarefeita de consumo..(não é.)
oh! registro dos meus ideais e conduta de rumo..(não. é.)



"locus"
por: um período-re.composto
esboço.ao: que me parecia real
(pois)eu

duvidei. à era deste tolo-conto
e começei. à queda deste lado pois, chamas.



e,
agora corre..
levanta.
asas incendiárias em voltas/e-voltas febris
à caçada de todas as memórias esquecidas
às estacas. que eu sempre escondi.




pois,




ferve, lado repente!
e
descrente
e
decrescente
e

aqui, sempre, ou.




















em quartos(tantos) de ar.
(de mim)




























.


Poema de Azke.

Kali-yuga

Estupefato observo o mundo
Cambaleando em uma só perna.
A tourada cruel, planetária,
Incendeia os corações distraídos.
Na arena gigantesca
Digladiam-se, aos gritos,
Os Albels e os Cains em uníssima vibração odienta.
Eis que o soar das trombetas,
Tão esperada e decantada,
Vem pela garganta dos próprios degredados,
É o último brado, o estertorar.
Começa a ceifa,
O joio e o trigo são apartados.
O grande êxodo é a última instância,
Portanto inexorável, sem apelação,
A sinfonia deprimente do ranger de dentes,
A batida final do grande martelo transcendental.
As setas cruzam os espaços siderais,
Os carros de fogo
Transportam os mendigos da paz,
Estiolados na refrega equivocada.
Os cordeiros são os lobos de si mesmos.
Eis o segredo desvelado,
A metáfora dos canibais.

Poema de Milton Filho

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Da sacada

Da sacada, longe, olho o rio e a estrada
olho o horizonte, tentando ver o além
como alguém que olha para o nada

Da sacada, perto, olho a rua e a calçada
olho a chuva descendo, a enxurrada
também os galhos judiados pela invernada

Da sacada, olho tudo e não vejo nada
olho o dia passar e o inverno chegar
a neblina das manhãs e a vida maltratada

Da sacada, faço uma arquibancada
olho curioso, como quem não quer nada
a loira que passa e a morena, que graça

Na sacada, a loira que passa me olha
e a morena, essa nem na sacada...

Poema de Kleber J G Martins

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Progressão

"turno - 1"





da mensagem que deixei pra trás..

da asa sem rumo por onde, à quimera destas letras,
tão tardias,
ora, em punho por destreza e.de se rebelar..
ah,
em palco
declina.
ante à qualquer noção de vento por um pacto solto (e)de ar
quando..
à quimera desta centelha, qual não pude carregar..e.aos.. meus ombros listrados de sangue por batalhar cego
ora,
submerso, defronte ao poço, qual um dia, eu pretendi..

- deve-me à lápide!

à parte que te cabe e por centeio em deste campo, o meu.

- deve-me à in.vontade..
(passagem)

ou custeio,
em demasia de consulta por arbítrio em livro-alvo de mim..

eu,
acto por inicio dos meus dias
dos meus
passos por
tamanha incompreensão

ah,
quando muito,
por descer-me à terra em busca de um vestígio teu,

quando nada,

de culpar às minhas paragens,
o destino-pouco destes espaços

hoje, tão vagos

e
por não os querer mais,
vai..

teu romeu é aquele que te sabe..
não este,

que se/te perdeu.

Poema de Azke.

Eva

perseguia o rastro
de bar em bar
de espelho em espelho
emendava um cigarro no outro
uma hora na outra
tirava o fôlego da foto
de tanto olhar

beijava o ar, a rua
desfiava o arrastão da meia pelas ruas
toda Eva sofria
rasgava o tango
a noite girava debaixo dos pés

o salto chora o quebrado
sem ninguém
dói indiferente
recosta a sombra
com um brinco só
na brita quente
a vida vira asfalto
por dentro vasculha como faca
o rastro não perde o perfume
não adormece
fico em vigília

Poesia de Vânia Lopez

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Deveres desumanos

Não me comovo.
Pau no cu
da ararinha azul!
Eu quero é ovo!

A Lei do Homem rege um mundo sem leis.

E eis que aqui está escrito
: propaganda política é propaganda enganosa
e onde lê-se: Horário Eleitoral Humorístico,
violência gratuita, agora está escrito.
Congresso não rima com Progresso
se o direito ao voto é obrigatório.
Assim está escrito.

De braços cruzados - de bruços no chão!

E eis que aqui está escrito
: o bonito é ser feio
ou quem só tira foto não fica feio na foto
e onde lê-se: o papel da imprensa marrom
não serve nem pra limpar a bunda, agora está escrito
: a arte retrata a miséria humana só para leigos
e uma imagem vale mais do que 15 minutos de cama.
Assim está escrito.

Como ter modos perante um mundo disforme?

E eis que aqui está escrito
: nada mais lúdico do que o R$,
pois o lúdico ilude e o ilusório aliena
e onde lê-se: a alienação é a base de todo
sofrimento humano, agora está escrito: nos outdoors,
automóveis e modelos ocultam favelas de concreto
onde meninas de 11 anos menstruam fetos.
Assim está escrito.

Viadutos para os desabrigados!

E eis que aqui está escrito
: o povo é solidário e a elite, caridosa
e onde lê-se: o povo precisa de um atirador de elite,
porque burguês tem que morrer no ninho,
agora está escrito: sem essa de final feliz
que eu não morro sempre.
O contentamento é a única unanimidade.
Assim está escrito.

Felizes são os xucros!

E eis que aqui está escrito
: se existisse moradia não existia FEBEM
e onde lê-se: quem fez faculdade tá comendo merda
e quem não fez, não tem merda pra comer,
agora está escrito: pra quem tem o mundo nas mãos
e uma garganta rouca e louca para gritar,
como se sentir impotente diante da TV?
Assim está escrito.

O Mundo é nosso, mas abraçá-lo não posso.

E eis que aqui está escrito
: confio mais no meu medo do que na tua coragem
e onde lê-se: à merda com toda essa droga
e à merda com tudo isso agora, está escrito:
todo mundo se mata, todo mundo é vivo.
Assim está escrito.

A condição humana é servidão!

E eis que aqui está escrito
: eis a arte de simplificar o inexplicável
- a revolução particular do poeta -
e onde lê-se: os ricos matam os pobres e os pobres
matam os ricos, agora está escrito:
o meu ouvido não tem paredes. Sim!
Assim está escrito.

O que é de todos não se divide.

Poema de Andri Carvão

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Flores de maio

Insofismável

Este corpo que atravessa a vida, a garganta, o tempo
atravessa o fosso, a fossa, o vento
sempre mensurável como o gado e o feno

Este corpo, irrecusável instrumento, indissoluvelmente afinado com o tempo
luta para se manter atento, pulsante e, às vezes, dormente
como porta, concha, moinho, cata-vento

Atravessa a noite, o sono, o sonho, a estação, o trem
a fronha, o cabelo, o pente

Veste caras, amores, rancores, bocas, dentes
abraços, espantos, pássaros, serpentes.

Atravessa o gozo, o abraço e a aguardente

Contudo, acorda pesado
e só não consegue atravessar a cova, a faca, a dor de dente.


Poema de Hideraldo Montenegro

Pousem os lápis

levanta os olhos com tanto amor
como uma longa carta de amor
olho você e preferiria olhar você
a qualquer foto cúmplice a dividir memórias
todas ficam tão sem rosto
que corro o risco de me apaixonar por você...
a alma quer pular pela garganta
as mãos se afogam
como um damasco amassado e pisoteado
para sua próxima vida
o chão não apaga o barulho
cantando distante como uma cotovia
as palavras perdem os seus objetivos de vista
a vida vira hóspede de seus olhos
(vão ao mesmo alfaiate)
contando números primos na mão
em parte porque do centro da minha vida
surgi um garoto dos ossos grandes
pés descalços da grama recém cortada dos caminhos
comendo o chão desse lugar
rompendo o silencio
permitindo que as palavras flutuem
libertando o lápis a pronunciar afirmações sobre o papel:
-eu sou o amor, mas também sou o papel
como metade das palavras e depois
passo a madrugada inteira dormindo no resto.

como uma árvore respirando...


Poema de Vânia Lopez

segunda-feira, 13 de junho de 2011

"E tudo um dia muda"...


...
Será que foi mesmo amor?
Ou apenas um sonho bonito
Com a metade da lua fosca?

Já não sei mais de mim...
Nem de você.

Disseram-me que saíste por aí sem relógio, sem casaco...
Só com o coração a pulsar... 

Pulsa tanto, pulsa alto, que ouço daqui!...
Confesso-te que esse barulho todo me agita os instintos, tira-me o sono...

Ecoa com força na alma do meu coração.

Estou vivendo
Estou até feliz...
A vida é uma só
A vida é um triz...

Quem sabe num desses dias frios te encontro numa cafeteria...
 Desejando esquentar seu corpo noutro corpo...

Mas por falta de opção, cai bem um café quente com pão.
- Quem sabe?
A vida é curta,
O mundo gira... E a lua puta, resolve sempre ir a luta...
Colocando seus preferidos personagens na luta de um dia se encontrarem...

Quando num piscar de olhos:
"tudo se agita,
tudo muda de lugar,
tudo parece não ser real".

Imagina, até ontem um caos total.
Hoje, o susto!
Hoje, o silêncio do mundo.
Hoje, somente o barulho absurdo de um coração bruto que bate sem respeito aos que dormem.
Hoje, um suspiro profundo, sincero.
Hoje, a vontade louca de tocar-te só para constatar se o antigo ainda é de carne e osso...
Ou apenas um sonho banal,
Um fantasma querendo tirar-me a calma,
Um idiota pesadelo querendo queimar-me a carne em desespero
Um louco varrido sem sentimentos ousando espancar-me a alma.
Tudo é tudo demais nessas horas.

Meus passos, já dei...
Marquei todas as trilhas.
Meus beijos salivados nos seus, enrosquei.
Meu coração analfabeto, cego, te entreguei.
Agora só depende da lei.


A lei do amor,
Essa lei decide se o erro foi acerto
Ou se o acerto foi um erro.
Nessa confusão não coloco nem as mãos,
Estou deixando o vento guiar-me
Não sei de mais nada e nada me cabe!
O que sinto é apenas saudade...
Mas passa...
Pego meu velho vinil e ouço um bom som...
Saio, danço, escrevo...
E tudo fica "normal".
E tudo é carnaval.
Não é o que de verdade queria
- Mas já entendi há tempos...
Que o que mais se quer é o que menos se tem.

Estou testando meu lado contraditório da vida."Quero e não penso.
Desejo e não lamento
Busco sem falar a direção em voz alta".
Aprendi a guardar as coisas lindas e importantes no meu coração.
Oh, esconderijo bom.
Ninguém desconfia quando abro meu sorriso largo e dou bom dia!
As pessoas são burras! Adoram frases feitas.
Adoram o provável, o já lido, o notável.
Mas sigo estranha com meu jeito sã.
Nessa sociedade de piratas preciso ser uma trambiqueira.
Por vezes vendo peixe podre e guardo o bom para minha mesa.
Farta em sentimentos de valor, eu já sou, só falta-me mesmo, o meu amor!
...

((( Camila Senna )))



PRISÃO

Os sinos badalam
Quebrando o silêncio
Que ficou no vilarejo

domingo, 12 de junho de 2011

Vamos dividir a violência

Vamos dividir a violência
como Cristo que repartiu o pão com seus apóstolos
: uma fatia para o crime desorganizado da sociedade
e uma migalha para os laranjas pés-de-chinelo,
outra fatia para o Playmobil Militar bandido fardado
e outra migalha para a corporação recheada de carunchos,
um pedaço razoável para a Igreja Católica
- que faz de tudo para esconder e esquecer -
e a maior parte para a camisinha do Papa
capitalista.

Vamos dividir a violência
como Cristo que multiplicou os peixes para seu povo
: uma fatia para o nosso machismo afeminado
e uma migalha para todo preconceito racial e social,
outra fatia para os motoristas imprudentes
e outra migalha para os pedestres preguiçosos,
um pedaço razoável para o estuprador e a prostituta
- que fazem de tudo por gozo e luxo -
e a maior parte para a constelação do Paraíso
individualista.

Vamos dividir a violência
como Cristo que idealizou um mundo em comunhão
: uma fatia para os políticos paleolíticos
e uma migalha para suas orquestras de eleitores,
outra fatia para toda censura física e moral
e outra migalha para os assassinos pró-pena de morte,
um pedaço razoável para o intelectual esnobe
- que faz de tudo pela autopromoção -
e a maior parte para o milagre da história
moralista.

Vamos dividir a violência
como Cristo que se crucificou por amar demais
: uma fatia para os homens com seus relógios
e uma migalha para os jovens com seus umbigos,
outra fatia para as mulheres com seus espelhos
e outra migalha para as crianças sem fim nem futuro,
um pedaço razoável para drogados e caretas
- que fazem de tudo para viver à margem -
e a maior parte para a condição humana
maniqueísta.

Poema de Andri Carvão

sábado, 11 de junho de 2011

É preciso amar o diabo

É preciso amar o diabo,
Touro e carneiro sobre nossas carnes,
Aranha, desejo
Sobre as horas vazias.

É preciso amar o diabo,
Mosca a rodear
As nossas pestilências,
Mão que flagela e alicia.

É preciso amar o diabo,
Abutre a estraçalhar-nos,
Negror a nos subornar
Com um saco de moedas.

É preciso amar o diabo,
Moabita a nos aguilhoar
Desde Fegor, língua e falo
A nos violar com labaredas.

É preciso amar o diabo,
Boca, bacilo, a nos morder
Com milhões de dentes,
Líbia a nos tornar o seu vassalo.

É preciso amar o diabo,
Goela a nos beber concupiscente,
Monstro do Oriente, tentáculos
E ventre a excitar-nos os mamilos.

É preciso amar o diabo,
Satã, Baal, Lúcifer e Asmodeu,
Luz que o próprio Deus
Quer nos roubar...

Felipe Mendonça -
Todos os direitos reservados.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Desde

ar-indireto
à peça das minhas próprias-contas e fins
por letras insones
todas jogadas em um grande e fundo, baú

assim,
é tempo!

por retenção em verso esquecido
febril
a letra por cair em laços dos meus arremessos
à mente por uma imagem à infinda hora de ti
palco anti-horário
lenda que não me passa
que não me acorda quando em turno
pós-queda
ah, eu..

livrava-te corrente permissiva, se
ao menos, eu não quisesse te roubar o que te há
pois,
incêndio
pressuposto acto de idéias
mero conselho e/ou ponto revisto
exemplo

eu
espero

à tarde-noite dos meus dias, a re-criarem-te
paragem à laje que for
à carne desta letra que te trago
e também, onde não estou

eu,
esqueço-me.
eu,
aqueço-me antes de deitar o teu nome pra sempre..





















.
...

















precipício
remoto caso-lúcido à alvorada e último-fim.
usurpam-me às esperas que não te sei
das noites desiguais e longínquas
em
parte destes olhos que te fecham
e
desaba-te página que, por ora teimo,
pois











tolo, sou..


Poema de Azke.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Um pouco de tudo, um pouco de nada

Quem pode, pode
Quem não pode
Sacode
O ombro
A cadeira
A poeira

Quem diz que faz
Não faz nada
Ou faz muito
E o muito é pouco
E o pouco é nada
Então, tanto faz

Quem é barbeiro
Faz a barba
Corta o cabelo
Dirige mal
Ou é o barbeiro
De Sevilha?

Quem muito reza
Pede muito
Promete tudo
Não cumpre nada
E culpa o santo!

Quem escuta demais
Conta errado
Aumenta
Inventa
E, pensa
Que é verdade

Quem sabe muito
É letrado, pós-graduado
Advogado de Deus e do diabo
Médico, louco, curandeiro
É quase um Deus verdadeiro

Somos uma incógnita
Com ou sem lógica
Complexos, com ou
Sem nexo, um pouco
De tudo um pouco
De nada...

Poema de Sandra Soares

SEMENTES



Foram semeadas
Antes do outono

Cobriram o vale
Com flores
Que não tinham
Jardim para embelezar

E ficaram por ali

Esperando a noite chegar

sábado, 4 de junho de 2011

Sessão do descarrego

Sangue de boi
Sangue de cristo
O que é que foi?
O que foi isto?

Blasfemar
Vociferar
Descarregar

Soltar os cachorros
Soltar os demônios
Espantar os maus espíritos
Descer a lenha
Sentar o pau
Baixar o cacete
Deitar a madeira
Chutar o balde
Chutar o pau da barraca
Quebrar as estruturas
Rodar a baiana

Soltar o verbo

Depender dos outros
É pagar o pato
Engolir sapo
E cair do cavalo

A esposa crente
O marido cachaceiro

Roubou matou estuprou seqüestrou falsificou extorquiu
A ficha é extensa
Transgrediu todas as leis humanas e divinas
Foi pego
Convertido nasceu de novo
Um homem e tanto
Um homem santo
Agora transmite ensinamentos bíblicos
Mistos a sua experiência pessoal
Aos colegas de cela
Em versículos que
Ora rezam assim

O juiz bateu o martelo
30 anos de prisão
O cara ficou amarelo
A cara caiu no chão

Jesus não foi aceito
Então galgou a cruz
Um cabra de peito
Errou e aceitou Jesus

Jesus jejuou
Plantou
Colheu
Pregou
Até ficar pregado
E ressuscitou
No terceiro dia

O cão comeu
Plantou
Colheu
Pecou
Até faltar pecado
E regurgitou
A marmita fria

Zé Mané
Zé Ruela
Zé Ninguém
Zero a esquerda

Aquém do além
Amém

Poema de Andri Carvão

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Impulso

presente-resposta.
hora.
porta-demarcada em comum lapso ou cena-incisão
à pele.
de carta-reparada onde, à palavra.me perdi
por pensar adentro da tormenta
seja breve, seja sempre
ou ao palco onde falas servis, calam-se.
à primazia de um pouco mais
de
dor


palavra


ponto dos meus desejos às tuas todas condições
minhas esperas e contos e imagens-vagas
e um pouco
(mais)de
incisão

à pele desta seta onde me deixei
seguindo o passo que julguei re-conhecer
ou
ilustrar-me. ao tolo/mero acto-devaneio de, e mais um pouco
te.
pretender


e
cá,
jaz.



este nome exceptuado pelas minhas cenas de mãos
aos esboços compulsórios em imprecisão e lenda

aos olhos que deitei e paguei
aos espelhos que não mais te sei


ao término de um quase-nunca arbítrio
ou
mesmo

nunca, enfim..

















lêdo-engano.
lêdo-engano meu..
pensei, em ser-te ao extremo
e
não me pensei.


Poema de Azke