Manifesto do coletivo Pó de Poesia

O Poder da Poesia contra qualquer tipo de opressão
Que a Expressão Emocional vença.
E que o dia a dia seja uma grande possibilidade poética...
Se nascemos do pó, se ao morrer voltaremos do pó
Então queremos Renascer do pó da poesia
Queremos a beleza e a juventude do pó da poesia.
A poesia é pólvora. Explode!
O pó mágico da poesia transcende o senso comum.
Leva-nos para um outro mundo de criatividade, imaginação.
Para o desconhecido; o inatingível mundo das transgressões do amor
E da insondável vida...
Nosso tempo é o pó da ampulheta. Fugaz.
Como a palavra que escapa para formar o verso
O despretensioso verso...
Queremos desengavetar e sacudir o pó que esconde o poema...
Queremos o Pó da Poesia em todas as linguagens da Arte e da Cultura.
O Pó que cura.
Queremos ressignificar a palavra Pó.
O pó da metáfora da poesia.
A poesia em todos os poros.
A poesia na veia.


Creia.


A poesia pode.


(Ivone Landim)



domingo, 31 de julho de 2011

O rei da chuva

O REI DA CHUVA


Apenas um louco, era o que diziam. O maluco oficial da cidade, se antiguidade

na doidice, fosse posto. Cabelos imemorialmente grisalhos, coroando a testa ampla e

enrugada, que avançava tal promontório sobre dois abestalhados olhos azuis, de olhar

triste;não daquela tristeza dos que têm olhos tristes por profissão(já falava alguém),

mas uma tristeza que era a toda hora jogada pra fora pelos olhos, assim parecia

funcionar sua natureza: jogando aquela ganga ruim contra a cara dos outros e as

pedras da rua; ainda assim uma tristeza intrigante, porque sábia e aparvalhada era o

que também parecia e tudo de uma vez só, confundindo as pessoas, que passavam a

vê-lo só de baixo pra cima. Ah, sim: chamavam-no de Biu do Cego, ironia de

vida ou de morte, o possuidor de tão diferentes olhos, filho de um cego. Sentava–se por

horas a fio, na ponta da calçada do mercado, sempre no final da tarde, cismando sabe

Deus lá sobre o que, tirando do bolso esfarrapado, grãos de milho pegados do chão

escuro do mercado, que atirava no pátio, na festa dos pombos, alternando as mãos,

jogando ora por cima da cabeça, ora de costas, por cima dos ombros, arrulhando feito

pombo, com a pronta resposta deles, à sua louca generosidade; vez por outra, um

mais afoito segredava-lhe em vôo rente ao ouvido, Biu escancarava aquele riso de

porteira velha desconjuntada e a ave partia rápida, em direção ao ocaso do sol. O riso

apombalhado - porque não? Cansava-se, às vezes. Dava lugar ao rosto crispado e

ausente, angústia demente e silenciosa, barragem de pensamento, sem suspiro pra

correr. Nesses dias, parecia desligar-se do mundo, puxando um fio que só ele via,

trepando-se na velha jaqueira da entrada da cidade - quem sabe, pra ele uma saída? Ali,

matutando horas naquele juízo desleriado e pacífico, naquela doidice só pra uso dele

mesmo. Depois, dava por encerrada a questão e descia faceiro como um sagüi de tronco

abaixo, rindo, homem menino satisfeito consigo mesmo e com o mundo. Às vezes,

alguma mão caridosa, quem sabe negociando um lugarzinho lá no céu, deixava um de

comer pro miserável,lá entre as velhas raízes, sem dizer nada; se chamasse ele fazia –

se de mouco. Depois, descia, comia e voltava ao seu adoidado filosofar de pé-de-pau.

Não lembro mais quando - já sou promissória vencida nesse mundo de Deus, mas sei

que Biu do Cego já estava há quase quinze dias na jaqueira, sem comer nem se mexer.

Aboletou–se num galho e disparou um olhar de canhão enferrujado no horizonte, dias,

semanas. Depois, ficou olhando pra barriga, como se tentando entrar em si mesmo

pela porta do umbigo. Então, começaram as chuvas, que viraram aguaceiro, depois

cheia, depois flagelo de Deus ou do Diabo contra nós e ele mesmo, pois não é tudo

natureza? A correnteza levava tudo: homem, mulher, menino, jumento, todo tipo de

criação, nem a imagem do padroeiro agüentou, o cemitério virou campo sem porteira,

já não tinha vivos para enterrar os mortos, em muitas léguas. Os políticos vieram,

depois que a desgraça já era passada, engravatados, tirando retratos mais deles mesmos

que do arraso, muito dinheiro se prometeu. Os poucos sobreviventes ouviam, mas eu

sabia que o destino do palavrório era o mesmo do vento que lambia as serras, uma ida

sem retorno. Desci do abrigo do meu roçado no Morro do Agudo e caminhei feito

barata tonta, dando voltas, fazendo com os pés o que na cabeça já fazia desde há muito.

Na entrada da rua, vi a velha jaqueira, ainda de pé sabe por obra de Deus ou do

Tinhoso. Num dos galhos mais grossos, aboletava-se Biu do Cego, chorando de tanto

rir.


André Albuquerque

CORES DE OUTONO


Com as folhas de outono
Enfeitando o chão
Dá pra sentir
As gotas da chuva fina
Beijarem as folhas
Minhas pegadas se misturam
Com o tom amarelo
Ainda espero o céu se abrir
Para tentar ver entre as árvores
As sobras de nuvens
Que pintam o ambiente
E depois apenas seguir
Enquanto as folhas com som amarelo
Possam secar
Depois que a chuva passar