Manifesto do coletivo Pó de Poesia

O Poder da Poesia contra qualquer tipo de opressão
Que a Expressão Emocional vença.
E que o dia a dia seja uma grande possibilidade poética...
Se nascemos do pó, se ao morrer voltaremos do pó
Então queremos Renascer do pó da poesia
Queremos a beleza e a juventude do pó da poesia.
A poesia é pólvora. Explode!
O pó mágico da poesia transcende o senso comum.
Leva-nos para um outro mundo de criatividade, imaginação.
Para o desconhecido; o inatingível mundo das transgressões do amor
E da insondável vida...
Nosso tempo é o pó da ampulheta. Fugaz.
Como a palavra que escapa para formar o verso
O despretensioso verso...
Queremos desengavetar e sacudir o pó que esconde o poema...
Queremos o Pó da Poesia em todas as linguagens da Arte e da Cultura.
O Pó que cura.
Queremos ressignificar a palavra Pó.
O pó da metáfora da poesia.
A poesia em todos os poros.
A poesia na veia.


Creia.


A poesia pode.


(Ivone Landim)



sábado, 12 de janeiro de 2013

Dois Estranhos



Desde quando casou
Ela nunca mais apareceu.
Apenas sua imagem viva
Que não era mais a mesma de antes,
Pois aquele sentimento
Que era uma brincadeira
Agora é uma realidade
E como toda verdade,
Reprimida e duvidosa.
Então, toda vez que ela aparece
Ela não é mais aquela
Como eu não sou mais aquele.
Somos dois fantoches indiferentes
Perdidos na paisagem


Marcio Rufino

E QUE VENHA A PALAVRA




Que a palavra adentre o verso
em suaves movimentos
sem requintes, nem propósitos
pura e simplesmente escoe
como a fina areia de uma ampulheta
escorre sutilmente e sem pressa

Que a palavra entre como o vento
pelas frestas da janela entreaberta
e se acomode sobre as mobílias
formando uma fina camada de pó
encontrando seu lugar e seu momento
na casa da memória e do esquecimento

Que a palavra nos tome de surpresa
e se encaixe no quebra-cabeças
revelando todos os sentidos ocultos
todos os mistérios do não dito
nesse silêncio que cobre distâncias
nessa fera que habita o desconhecido

Que a palavra brilhe em súbito reconhecimento
como um eco sempre ouvido mas distante
como tudo que começa sem aviso
como o amor que de repente chega
sem que sequer se perceba quando
sem que se saiba onde estava guardado


Ianê Mello



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http://labirintosdaalma.blogspot.com.br/





Restos da América


Este poema é baseado no relato de Frei Bartolomé de Las Casas sobre a conquista da América e é a ele dedicado.

A ti, América, restaram somente
As avançadas furiosas,
O preclaro comandante à frente
Das hostes guerreiras
Ávidas de ouro e sangue!
Restaram-te somente
A pele trigueira ensangüentada,
Os crânios partidos
E os miolos esmigalhados
No solo calcinado.

Magua de Guarionex,
Marien de Guacanagari,
Maguana de Gonabo,
Xaraguá de Bechechio
E Higuey de Higuanama,
Reinos da Ilha Espanhola,
Outrora ricos e populosos,
Fecundos e abundantes,
De altas montanhas
E férteis riachos e ribeiros,
Tão grandes como o Ebro,
O Duero e o Guadalviquir,
Restaram-te somente
Tuas mulheres violadas,
Teus príncipes enforcados,
Os golpes de espada,
Os rumores de tantos prantos,
De tantos ais e gritos de pavor!
Restaram-te as lâminas perfurando
Os ventres grávidos,
Gargantas degoladas,
Os cães do preclaro comandante
A estraçalharem teus filhos,
As apostas cruéis sobre quem
De um só golpe de espada
Abriria um índio ao meio!
A ti, América, restaram somente
As chicotadas, as bastonadas,
As bofetadas, os socos e as maldições.

Sangrentas matanças nas ilhas
De São João e de Jamaica,
O sêmen corrupto
Do estupro e do assassínio
Na ilha de Cuba, do grão-senhor Harthuey.
Enfim, Neruda tinha razão!
A ti, América, restaram somente
A espada, a cruz e a fome!
Homens reluzentes
Que só conseguiam grunhir:
“- Donde está la plata? Donde está la plata?”
E a peste, e a morte e o terror
Que acompanhavam teus algozes!

De Nicarágua à Nova Espanha,
De Cholula à vila de Tepeaca,
Das províncias de Tupeque,
De Ipilcingo e de Columa,
De Guatamela, no mar do Sul,
A Naco, Honduras
Ou Guaiamura, no mar do Norte,
Sangue, tripas e extermínios
Consagraram tantas hóstias
Entre cânticos e louvores entoados
Sobre teu solo já abençoado, América!
Solo da onde brotou também
A carnificina e a perfídia,
A dissimulação e a mentira
A tirania e a devastação
Na prisão de Montezuma,
Na destruição de Viclatã,
Nas parturientes e velhos
Lançados às fossas
De estacas pontiagudas,
No escárnio do comandante
Que queimou os teus senhores,
Dizendo prestar-lhes homenagens.

A ti infligiram malditos estancieiros,
Terríveis calpisques,
Vis mineiros
Sedentos de ouro vil –
Eldorado manchado de sangue –
Malditos
A trucidar, a destruir,
A injuriar, a perturbar,
A prejudicar, a inquietar,
A atormentar, a oprimir a tua gente,
Enquanto se persignavam
Viciados, corrompidos
Desonestos e desordenados
Como um certo João Colmenero
Em Santa Marta.

Oh, pobres almas aflitas
Em tormentos, em angústias,
Em tristezas e aflições,
Oh, pobres almas amarguradas
Sob o jugo de mil aborrecimentos,
Sob o martírio de loucos enraivecidos,
De furiosos inimigos
Como a tenra carne estraçalhada
Entre os cornos de touros enfurecidos,
Como presas amarradas
A lobos, leões e tigres esfaimados –
Doze milhões de índios trucidados,
Quinhentos mil Lucaios expatriados,
Três mil léguas de terras,
Repletas de gente, arrasadas, desoladas.
Só Pedrarias, qual um lobo esfaimado
Que se lança sobre um rebanho de ovelhas pacíficas,
Tornou desertas mais de quarenta léguas,
De Darien à província de Nicarágua,
Matando, destruindo, queimando,
Seqüestrando, torturando, defraudando,
Roubando, aniquilando,
Desolando tudo e todos,
Tantos e tão grandes reinos
Desde o ano de 1504.

Oh, quantos órfãos deixados para trás,
Quantos homens e mulheres seqüestrados,
Quantas abominações execráveis,
Quantas calamidades e angústias,
Quantos suspiros e vagidos,
A liberdade roubada,
O corpo e a alma assassinados,
Os templos profanados
Por demônios, súditos
A servirem quem vive
De carne e sangue humanos.
Oh, toda tua riqueza
Na mão de gente iníqua,
Dos agualizes do campo
A perseguir e a caçar tua gente nas montanhas,
A manter toda a terra
Sob comenda cruel e tirânica
Todo o teu povo como se fosse
Paus, pedras, cães ou gatos
Vergastados com anguilhas, até a morte,
Por teus carrascos!


Oh, malditos e desnaturados
Que obrigavam reis e senhores
Homens e mulheres,
Crianças e velhos,
Tornados escravos e cortesãos,
A trabalharem dias inteiros, a fio, sob o sol,
Sem direito a descanso, água ou comida.
Malditos desmesurados
A separar famílias inteiras,
Maridos de suas mulheres,
Pais de seus filhos,
Mães de seus rebentos,
Tornando a vida tão desesperadora
Que as próprias mães
Esganavam e matavam seus filhos
Ou tomavam ervas para abortar
Ao sentirem-se grávidas.
Malditos responsáveis pela morte
De mais de sete mil crianças
Na ilha de Cuba, pela partilha
E pela fome de todo um continente,
Por tantos índios doentes,
Caídos pelos caminhos
Na desesperada tentativa
De encontrarem o caminho de volta para casa.

Oh, América de Panuco e Jalisco,
Do Reino de Iucatã
E da província de Santa Marta e Cartagena,
Da Ilha da Trindade ao Reino da Venezuela,
Dos Grandes Reino do Peru e de Granada,
Teus rios limpíssimos de súbito
Tingiram-se de rubra cor,
Teus campos férteis e formosos
Tornaram-se açougue de carne humana,
Alimento para abutres e soldados.

Não houve nem haverá
Tribunal que os condene,
Ação ou julgamento que reparem
Tamanho dano e destruição
Contra aqueles que diziam matar por direito.
América, não há quem te restitua
A riqueza roubada,
A glória perdida.
Agora, há somente
Um paraíso destruído,
A sangrenta história das matanças,
Tua nudez saqueada
Ante os mercados internacionais.

E hoje...
Hoje eu não vejo as edificações modernas,
Não vejo os autos passando velozes,
Nações fantasmas e a Plaza Mayor!
Não vejo conquistadores ou libertadores,
Pedro, Cortez, Alvarado, Montejo, Bolívar.
Vejo somente a História General de las Índias,
Generais e usurpadores!
Terra escravizada, grilhões nos meus pés,
Canudos!
Vejo somente o que restou
De um ato de violência,
Os filhos do estupro e da destruição,
As ruínas de Tenochtitlan,
Tua história, floresta e povo
Estarrecidamente dilacerados, América!

Felipe Mendonça -
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