Manifesto do coletivo Pó de Poesia

O Poder da Poesia contra qualquer tipo de opressão
Que a Expressão Emocional vença.
E que o dia a dia seja uma grande possibilidade poética...
Se nascemos do pó, se ao morrer voltaremos do pó
Então queremos Renascer do pó da poesia
Queremos a beleza e a juventude do pó da poesia.
A poesia é pólvora. Explode!
O pó mágico da poesia transcende o senso comum.
Leva-nos para um outro mundo de criatividade, imaginação.
Para o desconhecido; o inatingível mundo das transgressões do amor
E da insondável vida...
Nosso tempo é o pó da ampulheta. Fugaz.
Como a palavra que escapa para formar o verso
O despretensioso verso...
Queremos desengavetar e sacudir o pó que esconde o poema...
Queremos o Pó da Poesia em todas as linguagens da Arte e da Cultura.
O Pó que cura.
Queremos ressignificar a palavra Pó.
O pó da metáfora da poesia.
A poesia em todos os poros.
A poesia na veia.


Creia.


A poesia pode.


(Ivone Landim)



sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Dois poemas de Carlos Juba

PENSÃO FECHADA POR MOTIVOS DE FORÇA MENOR

Até amanhã.

serei hospedeiro de micro fauna
até amanhã

lá depois de abrir portas e janelas
e para sempre fechar
desabrigarei minha memória

ordem de despejo à memória!

chorarás no vazio
no vento ressequido
racharás tuas vísceras até o pó

não lamentes tanto:
até o pó é algo que voa

Esperneia!
enquanto pernas tens
já te sedo em semi-sonho
te alimento de larva onírica
com minhas colheres furadas
cai mais no chão
do que em ti
para desculpar
sem querer
minha maldade proposital

lembras do homem de Vitrúvio em quadro que me deste?
uma pena
teus olhos estarem ausentes
para ver
a árvore que irei amarrá-lo
a dor do homem que esquadrinhado na moldura
( e como tu entendias de molduras !)
sem poder a fuga
queimará da própria inércia
e do meu fogo

prefiro queimar o que está preso
por gostar menos de matar
do que deixar morrer

lenha para isso?
tuas roupas que ainda me restam:
o fogo de fibra

alimentado com o pó
da furada colher
caído no chão
e sem ainda levantar vôo no vento
logo quererás ser
outro bicho que puder
caber no mundo sem jaula

já me traio
o que salva é a falta de propósito

já confundo minha memória com teu tu
hospedagem maldita!
confundem-se o cheiro de musgo da pensão e dos corpos suados pensionistas...
tudo fede a velho
e os vermes se otimizam por não terem narizes

Avise:
hoje não tem refeição!
já te dei a comida eterna :
o dispêndio de energia.

ouça tua barriga roncar
até o obssessivo som metal badalar incessante
dia
noite
e dia nublado
como os tiros imaginários e eternos
de velhos generais de velhas guerras
que já loucos
não dormem sem ser Napoleão

tateaste o vazio da liberdade?

já estende a fibra dos teus braços
para alcançar o fio solto que te presenteará
com tua última eutanásia?

desalojo
desospedo
tu
teus porcos
teus cães
num chute só
amálgama pobre!
erás tudo num só
e isso era motivo de garbor!
então vá de uma só vez!

não, não vá!
agora não...
falta uma coisa ainda
um selinho apenas...
pra carta grande:
meu chute.

despacho
desalojo
desospedo
e aviso:

hoje não tem refeição!
só eu como.

estás pronto para a epifania da eutanásia?

amanhã!
(que já é hoje - longa morte tua descrita)
como na Antiga hecatombe grega!
serão mortos cem bois
e quatrocentas patas
no susto que apaga
se flexionarão
para os corpos de pêlo curto ruírem.

e acredites (já rio) :
não há ruínas em paz

hoje
fechadas as portas
tu não és tu : é mais aquilo

perguntarás o que terei feito
com o cheiro forte dos corpos...

direi o cheiro das fezes das coisas vivas
como incômodo maior
que o cheiro na anunciante inspiração
e respiração
do húmido putrefato
gestação da vida
através de placentas mortas
envoltório próprio dos coveiros
( sim! tu és um coveiro insistente!)
insatisfeitos que o outro morra
sem levar deles
nada que os recordem

acredite:
até os coveiros são vaidosos.

Morres hoje
que é amanhã
e depois
porque não sabes morrer.

Deixaste para mim tarefa
que hoje completo
com serena execução.

olha bem...
observa com aquilina cautela...
por debaixo do capuz...
vês uma luz pequena com dentes?
é o meu sorriso
que te mata
sem precisar de consolo

desalojo
desospedo
desamo tudo para caber espaço
e hoje
que é amanhã
o exílio-pensão-cortiço
de mal aguentar
o próprio cheiro
pelo bem
fecha as portas

e aviso:
hoje não tem refeição!

eternamente
só eu como.


A DOR EMBRANQUECE

A dor embranquece.

não é preciso chorar
se o fim são os outros olhos

vejo entre a porta aberta
alguém espiado por um longo caminho
bate à porta
no impacto de assustar
mal sabendo ser esperado
nada assusta
só dôo
sem nada doar
apesar da gentil recepção

Ah! Se soubessem a dor que mora na gentileza!
Habita mais dor na gentileza
do que na crueldade.
A crueldade é desinteressada
por anterior ser sempre
à qualquer motim que a deflagre.

Para quem ama o tudo
e detesta o nada
ser gentil
é pedir pelo mar passagem
quando se navega em armada
de força sabida.
É pedir com sorriso
e doer.
Dói a dor que doa compaixão
aos tocados pela gentileza
como bruma
mas ela é vento...
Vento!
Um vento condensado
para que se passe
entre duas nuvens
sem chover.

um vento empurra nuvens
mas não arrasta raios
de teimosia imanente
que o chão entre águas
tenta tocar
e quando toca
toca fogo
beija incinerando
muda os estados
abrupto
não volta sem avisar
sendo ele o descarrego de si
finda o corpo no próprio beijo
flameja à exaustão nula:
é energia

gentil com as nuvens
cruel com o chão
como tudo que remenda o contradito
e levita ao inverso

falo de raios
e hoje é sol
em quais curvas andei
então a criar
nuvens em mim?

hoje é sol
só até enquanto
a água não pesa

são gentis os raios
para quem na mata escura
caminha sem lampião
será para os vagalumes carentes
o relâmpago um deus?
cruel e gentil como um deus
que mais Deus é
quanto mais gentil for
estando sem ser

até vir o trovão
denúncia para os que ouvem
e mais nada conseguir disfarçar


Autoria: Carlos Juba

Poema

Durante horas de silêncio e sono,
De leitura e angústia,
Ante o cânone, ante incompreensível estro,
Ante confuso mundo, de tão claros enigmas,
Eu não sabia,
Mas o poema sempre esteve ali,
Qual ferida ou queixume,
Qual fruto ou negrume.
Deu o tempo e a técnica se fez no sofrimento:
- Fiat! disse algo dentro de mim
E, entre o fulgor e a escuridão, tímido, na penumbra,
Entre utopias deglutidas,
Poentas brochuras
E defuntas armas e canções
Contra os donos da ordem e do tempo,
Algo fundo revelou-se,
Fosso, abismo,
Exasperado grito
Ou simples pomo pendido.
Deu a hora e me precipitei,
Colhi o poema,
Trinquei os dentes nele
E o apreciei deveras,
Vociferado, em profundo negror
Com a boca esfaimada do mundo.
Senti sumo acre,
Sabor amaro,
Iniludível
E abismal.
Gostei
E não senti qualquer contentamento!
Hoje, ofereço-o,
Oceano ou ruína,
Fruto
Ou salto no abismo,
A quem quiser
Algo diferente do ópio, da fuga, da nuvem
E do frenesi diário e intenso,
Para sempre infenso
Às águas que afluem da memória.

Felipe Mendonça -
Todos os direitos reservados.