Manifesto do coletivo Pó de Poesia

O Poder da Poesia contra qualquer tipo de opressão
Que a Expressão Emocional vença.
E que o dia a dia seja uma grande possibilidade poética...
Se nascemos do pó, se ao morrer voltaremos do pó
Então queremos Renascer do pó da poesia
Queremos a beleza e a juventude do pó da poesia.
A poesia é pólvora. Explode!
O pó mágico da poesia transcende o senso comum.
Leva-nos para um outro mundo de criatividade, imaginação.
Para o desconhecido; o inatingível mundo das transgressões do amor
E da insondável vida...
Nosso tempo é o pó da ampulheta. Fugaz.
Como a palavra que escapa para formar o verso
O despretensioso verso...
Queremos desengavetar e sacudir o pó que esconde o poema...
Queremos o Pó da Poesia em todas as linguagens da Arte e da Cultura.
O Pó que cura.
Queremos ressignificar a palavra Pó.
O pó da metáfora da poesia.
A poesia em todos os poros.
A poesia na veia.


Creia.


A poesia pode.


(Ivone Landim)



terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Prosas poéticas

Vou suicidar-me no primeiro raio de sol

Vou suicidar-me no primeiro raio de sol. Já testamentei os meus parcos haveres: todo o sal do mar e as sereias pornográficas que copulam com o vento norte. Uma gaivota de crude.
Já me despedi de quem gosto: poetas sem lei, que vivem para além da morte, ledos.
Dei carta de alforria às prostitutas que trabalhavam nas esquinas dos meus olhos, encerrei os bordéis sujos nos meus dedos.
Promovi os pedintes a monarcas, fiz dos enjeitados nobres patriarcas.
Deixei dito que mais nenhuma criança cresceria antes do tempo, que a única lei vigente passaria a ser a da brincadeira e dos afectos.
Que o poema fosse a única matéria leccionada nas escolas, sítios amplos sem portas, janelas ou tectos.
Assinei papéis doando os meus orgãos: o fígado para ser transplantado num homem são, mas azedo e sem coração.
Os pulmões experimentados num réptil, os meus rins enxertados em árvores de fruto.
Paguei adiantado às carpideiras com o dinheiro sujo que ganhei amamentando o sistema, mesmo não tendo tetas, pregador de certezas, pastor crente de um rebanho de petas.
Espero que chorem, esperneiem, larguem baba e ranho por mim, e no final das exéquias se sirvam canapés, se leiam poetas malditos e o vinho esgote.
Para onde vou não preciso de memória, a palavra saudade deixará de fazer sentido, o próprio verso, mote.
Vou suicidar-me no primeiro raio de sol. Espero que me trespasse de luz o coração.

Ninguém morre e vai para o céu

Ninguém morre e vai para o céu.
Até se pode morrer e ir para um lugar abaixo de nós. Raiz de árvore, seiva de flor, estômago de pássaro.
Nesse caso a alma não levita, entranha-se na terra fecundando-a.
Há um espírito universal em tudo o que vive. Provavelmente até numa pedra. Na conjugação de todas as coisas. Há um espírito que vive numa obra de arte, nas páginas de um livro, na anatomia da memória. Na história.
A passagem de cada um de nós pela vida alimenta esse espírito, o que nos coloca a todos como irmãos. Filhos de uma mesma mãe.
Estar à espera de um céu depois de morrer, seja por via de uma licença passada pela igreja, seja por via da própria espiritualidade de cada um, é um pensamento profundamente redutor.
A função de cada ser nesta vida, é ser melhor. Signifique isso a capacidade de irmos perpetuando a beleza das coisas e das suas emoções, a nobreza dos gestos e da partilha, mesmo que cada um cometa erros, ou sinta que falhou num determinado momento.
O espírito de cada um realiza-se num todo. Não existe um qualquer lugar marcado no céu, não existe propriedade nem o seu direito.
A capacidade destrutiva do Homem faz parte do ciclo infinito da vida. A terra será uma rocha um dia, mas haverá sempre uma semente de liberdade a romper o chão, a vir da água, a trepar às árvores, a nascer do ventre de uma mulher, seja até num outro lugar.
A história da terra escreve-se em poema, a vida… é uma prosa só.


Autor: José Ilídio Torres