Manifesto do coletivo Pó de Poesia
O Poder da Poesia contra qualquer tipo de opressão
Que a Expressão Emocional vença.
E que o dia a dia seja uma grande possibilidade poética...
Se nascemos do pó, se ao morrer voltaremos do pó
Então queremos Renascer do pó da poesia
Queremos a beleza e a juventude do pó da poesia.
A poesia é pólvora. Explode!
O pó mágico da poesia transcende o senso comum.
Leva-nos para um outro mundo de criatividade, imaginação.
Para o desconhecido; o inatingível mundo das transgressões do amor
E da insondável vida...
Nosso tempo é o pó da ampulheta. Fugaz.
Como a palavra que escapa para formar o verso
O despretensioso verso...
Queremos desengavetar e sacudir o pó que esconde o poema...
Queremos o Pó da Poesia em todas as linguagens da Arte e da Cultura.
O Pó que cura.
Queremos ressignificar a palavra Pó.
O pó da metáfora da poesia.
A poesia em todos os poros.
A poesia na veia.
Creia.
A poesia pode.
(Ivone Landim)
sexta-feira, 28 de outubro de 2011
As irmãs Fox
escura, coberta por uma toalha muito puída, livros religiosos e muitas folhas de
papel em branco, lápis apontados, um tinteiro, duas penas. Mr. Duesler contou os
presentes, fechou a porta, lacrou-a com cera, depois de olhar fixamente para
Margaret e receber o discreto assentimento daquela cabeça jovem e tumultuada. Pensou
por trás do antiquado cavalheirismo, que aquilo tudo,poderia ser uma farsa grotesca,
às custas um trabalho desgraçado, com excelentes dividendos para a fé. Por Deus,
uma vez em ação, aquela frágil criatura suava por todos os poros, rangia a bela
dentadura; num esgar demoníaco e assustador, cruzava os braços, estalando os ossos,
franzia o cenho à maneira dos endemoniados, órbitas brancas por olhos revirados,
tal as estátuas da antiguidade. Nesta noite, acompanhava Mr. Duesler, um homem alto,
magro, jovem, de feições finas, queixo resoluto, modos muito reservados, num olhar
seguro e inquieto, musculoso apesar de magro – indicava-o o relevo de suas
coxas, sob a calça de tweed, enquanto sentava, pensativo com o seu chá, em singular
e cabisbaixa vaidade. Contemplava a mão direita, ostentando um pequeno anel de pedra
vermelha e saliente, no dedo médio, distraidamente girado pelo polegar; uma boca de
lábios finos, emoldurada por um ruivo cavanhaque, envelhecendo-o uns bons dez anos.
Observava agora Kate e Margaret, mas em erudita e curiosa atenção, digamos assim,
quem estuda uma dupla de raros espécimes de borboleta, bem fixados por alfinetes e
sob uma potente lupa. Tudo sob o controle da gaia ciência, pensaria aquele jovem
cético,tão britânico em sua frieza, devolvendo a xícara vazia ao aparador próximo de
sua cadeira. Levantou-se ao aceno de Mr. Duesler.
- Irmãos, apresento-vos o Dr. William Crookes, da Sociedade de Investigações
Psíquicas de Londres, estudioso de fenômenos metafísicos, convidado para observar in
loco o trabalho das irmãs Fox, anunciou a voz empostada de um vaidoso Mr. Duesler.
Apresentou-o primeiramente a Katie, entre sorrisos tímidos, até constrangidos de
ambas as partes. Margaret mantinha-se calada; como de costume, abandonaria o
mutismo, após todos se acomodarem ao redor da velha mesa de carvalho, com uma
vela posta no pesado castiçal, que logo seria acesa, com o desligar da iluminação a
gás,no início dos trabalhos.Katie observava aquele moço velho,sentindo-se assustada,
imaginando a distância percorrida pelo cientista; mais um daqueles movidos pela
fama das irmãs, que faziam girar mesas pesadas e grandes, com auxílio dos espíritos,
ajudando a descobrir e prender o autor de um assassinato que abalara a pequena e
sonolenta Hydesville, alguns anos atrás. Imaginava quanta coisa teria visto um
homem com tanta ciência e liberdade de ir e vir onde quisesse, falar com quem
quisesse,talvez flertar com algumas garotas mais desinibidas,enquanto ela e a
irmã, tornavam-se um tipo de atração circense naquele fim de mundo,conquistando
uma notoriedade que não as impedia de seguir acordando pela madrugada, ordenhando
as vacas, tirando água do poço e ainda cuidando da casa e do pai severo, viúvo desde
os trinta anos, pela tuberculose que lhe tomara a esposa. Hydesville, apenas uma
parada no meio do nada, vizinha de New York apenas três centímetros medidos no
papel do mapa; na prática, um mero intervalo empoeirado entre o nada e coisa nenhuma,
em 1847. Margaret fitava os sapatos londrinos do Dr. Crookes: novos, mas
arranhados, sujos, brigando com o restante de uma aparencia meio dândi para um
cientista, retratado pelos jornais, como uma espécie de caçador de fantasmas,
preciso e implacável com os fraudadores que desmistificara; àquela altura, uma
legião,sentados todos à mesa, as irmãs, Mrs Redfeld vizinha e propagandista de
primeira hora daqueles prodígios, Mr. Duesler, pastor e juiz de paz, sério e
ascético tal um mongeem seu trajar pietista, Dr. Crookes e Stephen
Smith, pai das moças e dono da casa, uma face onde a desconfiança e a mais
autêntica perplexidade alternavam-se em tragicômica sequência. Apagado o bico de
gás, a sala ficou um instante às escuras, até a luz da vela encorpar-se e
ganhar força. Seguiu- se a recitação das orações de costume, por Mr. Duesler;
ao final, um silêncio opressivo dominou a sala; quebrou-o a voz de Margaret,
solicitando dos presentes silêncio e pensamentos voltados para Deus, com um olhar
de soslaio e antipatia para o Dr. Crookes, lembrando do ceticismo que polvilhara
pó de arroz ao redor de todas as cadeiras e solicitara o lacre com a sua própria
cera, da porta da sala – suas condições para publicar um artigo sobre os
fenômenos , na prestigiosa revista da Sociedade de Investigações Psíquicas
de Londres; tirando do território do burlesco e da desconfiança, os
acontecimentos de Hydesville, convencendo o mundo da natureza espiritual e
divina que regia tudo aquilo; uma tese defendida há meses, por Mr. Duesler, de
dedo em riste e face em congesta convicção, durante o culto dominical.
Margaret solicitou que todos se dessem as mãos, para concentrar a energia do
ambiente; seu rosto contraiu-se num espasmo medonho enquanto um frêmito percorria a
mesa em toda sua circunferência,surpreendendo os presentes, que sentiam o móvel
sendo empurrado contra os seus braços, elevando-se do piso. Um forte cheiro de
ozônio saturou rapidamente a sala. Mr. Crookes sentiu todos os seus nervos tensos, a
serviço dos sentidos. Conseguia manter a tranqüilidade, olhando ao redor, mas a semi-
escuridão parecia espessar-se a cada olhar seu. A pesada mesa agora oscilava. Depois
de alguns minutos, retornou lentamente ao solo, o cheiro de ozônio começou a ficar
mais rarefeito. A cabeça de Katie, começou a liberar pelos ouvidos e pela
boca, uma substância vaporosa e luminosa, que parecia expandir-se na progressão
do transe silencioso e trêmulo. À luz mortiça da vela, a substância começou a
condensar-se em duas formas humanas, um homem e uma mulher, rostos indefinidos,
abraçados e nus, em meio a um magnífico e luminoso jardim. A mulher ofereceu uma
maçã ao homem fosforescente, que recebeu a fruta, enquanto uma serpente saía do seu
flanco esquerdo, picando-a furtivamente no pescoço; os rostos indefinidos
eram agora os de Katie e do Dr.Crookes. Exclamações de terror e surpresa
tiveram início, as pessoas ora rezavam aos gritos, ora gemiam de puro medo, voltadas
para uma Katie agora imóvel e de feições serenas. Dr. Crookes, reconheceu a cena de
um antigo livro religioso; estupefato, pulou da cadeira e acendeu o bico de gás; a
substância refluiu imediatamente para o corpo da médium. O cientista aproximou-se de
Kate, a tempo de constatar a sua morte e verificar-lhe o pescoço, perfurado por
dois orifícios diminutos e paralelos,talvez o preço por conhecer o Paraíso.
Conto de André Albuquerque
OBS: Ficção sobre pessoas reais e fenômenos paranormais, observados em 1847 ,
em Amytiville, nos EUA .Os acontecimentos narrados, são produto da imaginação
do autor , exclusivamente .
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